14 de dezembro de 2010

A NOVA QUESTÃO DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA


Responsabilidade Subsidiária, o que mudou com o julgamento da ADC 16?


Muito se tem noticiado no meio jurídico o recente julgamento no STF proferido na ADC 16/DF. Diante da grande repercussão que o tema tem causado, vamos descrever o caso, para melhor entender o que foi decidido pelo STF.

O objeto de ADC 16/DF foi a declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1.º, da Lei 8.666/93, que possui a seguinte redação:

Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.
§ 1º A inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.

Este dispositivo sempre despertou alguma divergência e críticas por parte da doutrina. No âmbito trabalhista, o TST editou a súmula 331 e no Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 297751/96 adotou a seguinte redação para o inciso IV daquele enunciado:

“IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto a órgãos da administração direta, das autarquia/fundações, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (artigo 71 da Lei nº 8.666/93).”

A partir de então, de modo a assegurar a responsabilidade subsidiária em caso de inadimplemento do demandado principal, a Administração Pública tem sido incluída no pólo passivo das reclamações trabalhistas, em que a prestação dos serviços do obreiro tenha algum liame com um contrato administrativo firmado entre a empregadora e o Poder Público. A situação é bastante comum nas terceirizações de determinados serviços, como vigilância, limpeza, exploração de petróleo, etc.

Depois de alguma divergência interna sobre o cabimento ou não da ADC 16/DF, o tema foi para o plenário do STF para a apreciação de seu mérito, o que ocorreu na sessão realizada no dia 24 de novembro. Na apreciação do tema, foi decidido pela maioria dos Ministros que artigo 71 e seu parágrafo único são constitucionais, e que o TST não poderia generalizar todas as situações, devendo analisar caso a caso se a inadimplência da contratada decorre de alguma omissão do dever de fiscalização pelo órgão público contratante.

Ou seja, a contrario sensu, conclui-se que a exclusão de responsabilidade prevista na redação dos dispositivos somente é aplicável quando constatado que a Administração foi diligente no dever de fiscalizar a execução do objeto contratual, inclusive no tocante ao cumprimento das obrigações trabalhistas dos empregados da contratada diretamente envolvidos naquela execução. O próprio ministro Cezar Peluso afirmou que “o STF não pode impedir o TST de, à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do poder público”. Por se estar tratando de uma possível omissão do poder público, deve-se ter em mente que a responsabilidade é subjetiva, conforme entendimento firmado em outros julgados pelo próprio STF.

Em recente julgado do dia 19 de outubro de 2010, oriundo do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte, foi mantido o entendimento de que a Súmula 331 do TST é aplicável em face ao inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, implicando na responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial, mesmo que em face do art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993

Destarte, que o contrato de prestação de serviços (terceirização) atrai a aplicação da Súmula 331 do colendo TST - matéria já pacificada na Justiça do Trabalho, resultando na responsabilidade subsidiária da tomadora dos serviços.

Examinando-se detidamente o § 1º do artigo 71 da Lei 8.666/93, percebe-se a toda evidência, que ele conflita com a Constituição Federal, precisamente seu art. 37, § 6º, que assim dispõe, in verbis:

“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”

Esta concepção encontra ressonância na jurisprudência superior, haja vista a Súmula nº 331 do colendo TST, sendo também fortemente endossada pela doutrina nacional e estrangeira.

Cumpre observar ademais que o vínculo empregatício é reconhecido com a empresa contratada, não havendo com isso qualquer ofensa ou contrariedade ao disposto no inciso II da aludida Súmula.

Noutra vertente, o art. 71, § 1º, deve também guardar sintonia com dispositivos outros da Lei 8.666/93, tais como o art. 29, inciso IV e art. 55, incisos XIII, os quais impõem ao contratado a obrigação de manter, durante a execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, cabendo, por outro lado, ao órgão ou entidade da administração pública contratante o dever de vigilância e fiscalização quanto ao fiel cumprimento dessa exigência legal.

Nesta linha de raciocínio, o TRT da 21ª Região entendeu que é responsável em caráter subsidiário a tomadora do serviço, porquanto permitiu que empresa com a qual contratou fraudasse a legislação no que toca ao cumprimento das obrigações trabalhistas da reclamante.

Não cabe se descurar aqui de uma incursão na teoria moderna da responsabilidade civil em que, sem sombra de dúvidas, se louvou o julgador do TST ao editar a súmula nº 331, prescrevendo a condenação subsidiária do tomador de serviços. Ocorre que este, ao se valer de contrato com o intuito de obter mão-de-obra para a consecução de suas atividades, deve atentar para a idoneidade do contratado, sob pena de, em não o fazendo, arcar com os prejuízos daí advindos, em razão da culpa in eligendo ou in vigilando.

De toda sorte, a referida súmula do TST sequer condiciona a responsabilidade subsidiária da tomadora à efetiva inidoneidade da prestadora, mas ao mero inadimplemento, por esta, das obrigações trabalhistas, o que se afigura inquestionável. E, nesse sentido, é evidente que a tomadora de serviço não cumprindo a totalidade das obrigações decorrentes do contrato de trabalho, por conseguinte, mantém-se a condenação subsidiária do tomador dos serviços.

Extrai-se do art. 455 da CLT que, nas relações triangulares, permanentes ou não, o beneficiário da prestação laborativa, embora não considerado empregador, é co-responsável pelo atendimento dos direitos sociais do empregado.

Portanto, à vista do julgamento da ADC 16, permanece, ainda, o entendimento pelos tribunais superiores, que a tomadora de serviços é responsável subsidiariamente pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, inexistindo violação às seguintes normas: art. 37, incisos I e II da Constituição Federal; art. 8º da CLT; e Lei nº 8.666/93.


Carlos César de Carvalho Lopes
Advogado

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